Crônica: Atendimento nas alturas (reflexão sobre o serviço das cias. aéreas no Brasil) - Por Sr. Gentileza.

“- Seja bem vindo a bordo senhor”, “- Estamos à disposição no que for preciso”, “- Volte sempre”, “- Agradecemos a preferência”, entre outras frases feitas que ilustram nosso dia a dia nos céus do Brasil e do mundo. Nós, viajantes frequentes, a trabalho ou a lazer, para reuniões ou conferências, visitas à família, ou simplesmente para conhecer algum lugar, somos recebidos assim, exatamente assim, com um calor que não sabemos de onde vem.
Esse é o padrão de atendimento das cias. aéreas, prestadoras de serviço de transporte, que vivem uma disputa acirrada para conquistar clientes, laçá-los a qualquer custo e segurá-los com rédeas curtas. “- Vamos encantar e fidelizar nossos clientes” – esse sim é o discurso mais ouvido em treinamentos e reuniões de equipe e que resume o que todos querem: faturar e cativar pessoas para que consumam, voltem e sintam-se em casa.
Nós, brasileiros, somos conhecidos pela excelência em receber pessoas. Não existe – no mundo – país mais receptivo e cheio de calor humano que o nosso. Temos sol o ano inteiro, belezas naturais incalculáveis, média com pão na chapa, Pão de Açúcar, Pelourinho, Avenida Paulista e um povo belo, radiante e que está sempre disposto a servir.
Tudo isso deveria ser motivo para que a gente se sentisse à vontade para atender quem quer que fosse: clientes daqui, clientes de fora, amigos ou desconhecidos. Temos garra para atender, gana em ser útil e, o que muitos “gringos” nem sabem que existe: força de vontade.
Mas, mesmo assim, a coisa está degringolando de vez e esse tal de “atendimento-de-excelência” está se transformando em sonho de consumo de muita clientela, em especial as exigentes como eu.
Lembro que quando era criança, imaginava como seria estar dentro de um avião. Idealizava e fantasiava todas as situações como se estivesse embarcando, recebendo os lanchinhos das aeromoças, conhecendo a cabine do piloto e chegando ao meu destino final, sempre horas e horas de distância do ponto de origem; nem pensar em viajar na ponte aérea Rio-São Paulo, pois não desperdiçaria meu sonho aéreo em apenas alguns minutos.
Pois bem, senhoras e senhores, tinha certeza de que seria tratado com esmero, cuidados e atravessaria um tapete vermelho (sempre a minha espera) no saguão do aeroporto. É isso aí, nada de fantasia, pois é esse tipo de atendimento que todos merecem, mas não têm.
Poderia citar a melhor, a pior ou mesmo a intermediária no atendimento, mas o fato é: não interessa o nome, o que as pessoas querem é excelência em qualquer empresa, prestadora de serviço, etc. e tal. Aí, o que vemos? Atendentes mal humorados, irritados, cansados, comissários de bordo sem vontade de receber, de servir; será se terão indisposição na hora de uma pane no avião ou numa queda? Segurem-se quem puder; farinha pouca meu pirão primeiro; cadê o meu paraquedas?
Lembram-se de que, antigamente, líamos em livros e aprendíamos em cursos que o cliente sempre tinha razão? O cliente é a pessoa mais importante que existe para qualquer empresa, pois é ele que paga os nossos salários.
Me lembro como se fosse hoje da minha mãe dizendo isso com vendedoras de sapato, roupas, supermercados, bancos, empresas de ônibus e muito mais. Nós fomos doutrinados a exigir esse comportamento educado e gentil de quem quer que fosse, pois devemos fazer valer nossos direitos – o Código de Defesa do Consumidor que o diga.
Porém, ninguém nunca disse que as técnicas de atendimento aprendidas em treinamentos têm prazo de validade e devem acompanhar a globalização do planeta. Não dá pra ficar restrito a normas de conduta e atendimento ao cliente descritas num manual ou livreto passo a passo.
O ser humano quer muito mais do que isso e as empresas ainda não se deram conta de que os clientes, aqueles que realmente valem à pena, desejam um atendimento com alma, com coração, coisa que poucos conseguem transmitir.
Depois que cresci e aprendi que os sonhos de infância se tornam realidade – nem muitas vezes lindos – definitivamente fiz o caminho contrário de muitos líderes e empresários do setor de serviços. Além de chegar a conclusão que os treinamentos específicos de atendimento só servem para resolver problemas imediatos, não solucionam o “x” da questão: o atendimento e relacionamento internos. Pois é, a captação e fidelização de clientes estão diretamente ligadas ao ambiente de trabalho, interno, aquele onde os clientes não podem ver – mas podem sentir.
Qual é o fator determinante para a escolha de um produto ou serviço? Quais os parâmetros necessários para fechar uma venda? Quais critérios são utilizados para a decisão de um cliente? Posso elencar centenas de motivos ou razões aqui, mas o principal de todos é quando percebe que o Atendente, Recepcionista, Vendedor, etc., está satisfeito com o seu emprego. Isso mesmo! Lógico que o cliente não para pra pensar nisso, pois é uma reação inconsciente. Na verdade, ele firma uma negociação com sua empresa ou comércio se perceber a alegria no local. Você deve se perguntar como isso é possível, já que os colaboradores adoram usar o tempo livre para falar dos outros, maldizer a empresa, formar grupinhos ou coisas do tipo. Esse comportamento existe porque os exemplos não são os melhores possíveis.
“- Em alguns instantes iniciaremos nosso serviço de bordo”. Oba! Enfim chegou o momento mais esperado de uma viagem nas nuvens: comer, beber e descobrir o que vem dentro daquelas caixinhas de papel. “- Bebida senhor?”. “Simmmmm, quero tudo o que tenho direito”. Lógico que ninguém fala isso, mas pensa.

Num atendimento completo estão inclusos: presteza, cordialidade, segurança, sorriso no rosto, boa educação e, claro, gentileza. Esse é o pacote completo que devemos comprar em qualquer lugar. Quando era criança sempre tinha em mãos: pacotes de balas, bolinhas de gude e minhas fantasias – sempre perfeitas.

Luiz Gabriel Tiago - Sr. Gentileza
Escritor, Conferencista e Ativista na causa da Gentileza urbana.
Email: srgentileza@srgentileza.com.br

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