Texto: Sobre amar os não-amáveis e situações não-amáveis * Luiz Gabriel Tiago.


Esse é um dever de casa muito importante, senhoras e senhores. Trata-se de uma investigação pessoal a respeito do sujeito amável e da situação também amável. Você terá que saber quem ou o quê são dignos de se sentirem/serem amados por você porque são esses que devem receber o que você tem de melhor para oferecer antes de qualquer outra coisa – ou, quem sabe, somente eles, por exclusividade. É justo, diriam os racionais.

Porque conjecturar a respeito disso, já que é tão óbvio? Desde que o mundo é mundo, fomos ensinados a retribuir o amor recebido. Amor se paga com amor, com a mesma moeda. Fez por merecer.

De acordo com os dicionários disponíveis, a palavra amável significa – que merece afeto, amor, cortesia; é digno de ser amado. Reforçando, assim, tudo o que aprendemos também desde a infância a respeito da retribuição, tida como gratidão ou, simplesmente, é por merecimento. O digno é aquele que merece; é credor; está em conformidade; é adequado. Tudo o que precisamos saber para cumprir o papel de bom moço e mocinha da sociedade mundial: amor com amor.

Até aí caminhamos bem pois, pelo menos, ensinamos a todos a amarem aos amáveis, a retribuir com carinho, com afeto, sempre e todas as vezes que alguém nos estender a mão, sorrir pra você, te dar um copo com água, preparar um brigadeiro, te presentear no aniversário, emprestar dinheiro, concordar com suas ideias, te elogiar, dormir de conchinha, fazer uma massagem ou cafuné, te dar carona, convidar para o cinema, te ouvir, pagar um sorvete de casquinha, orar por você, te levar pra almoçar fora, servir de cupido, testemunhar a seu favor, mentir pra te safar de alguma furada, dizer que está lindo (a), te acompanhar numa consulta médica, eticétera, eticétera, eticétera.

Você está prestando atenção nos seus pensamentos nesse momento? Está lembrando de pessoas incríveis que passaram pela sua vida ou ainda estão? Essa é a tarefa: listar quem ou o quê são dignos do seu amor. Lembrou sim! Nem adianta fazer cara de paisagem ou coçar a cabeça. Todo mundo já retribuiu gestos amorosos, situações amáveis. Então continua pensando pois isso será importante para o desenrolar dessas anotações de caderneta.

A lista de possibilidades amorosas retribuíveis é imensa. Quantas formas de amar alguém, de fazer o bem, de cativar o que é bom, o que é muito bom. Todos eles são dignos de receber o que há de melhor em você pois fizeram por onde, são merecedores.

Assim ensinamos a compensar o amor. Assim ensinamos a compartilhar no amor. Assim ensinamos a aceitar no amor. Assim aprendemos a respeitar o amor. Assim aprendemos a acreditar no amor por amor. Assim ensinamos. Assim aprendemos. Amor por amor. Bravo. Parabéns por isso. Sua lista deve ser grande.

Século vinte e um., 21, XXI – o século do amorrr. Esse é o século do amorrr com amorrr e do amorrr sem amorrr também. A palavra amor ganha mais dois erres (amorrr – com três erres) para reforçar sua tarefa de transformar a humanidade e povoar o mundo de pessoas amorosas e dispostas a conviver em paz sem julgamentos ou promoção de guerras. A Pontinho de Luz traz à tona a necessidade de amarmos indistintamente e desafia toda a sua família a fazer o amorrr ser amado. Para isso, devemos ensinar as crianças a serem fiéis a ele (ao amorrr) e amar, principalmente, as pessoas e situações não-amáveis.

Isso significa que a nossa lista de pessoas e situações amáveis ganhará mais linhas e nomes pois os não-merecedores também deverão ser retribuídos com o que há de melhor dentro de nós. Ódio com amorrr se paga. Guerra com paz se paga. Briga com bandeira branca se paga. Ciúme com desapego se paga. Orgulho com humildade se paga. Barulho com silêncio se paga. Cativeiro com liberdade se paga. Ostentação com simplicidade se paga. Ingratidão com gratidão se paga. Ofensa com elogio se paga. Pessimismo com otimismo se paga. Pé no chão lunatismo se paga. Careta com beijinho se paga. Jiló com pudim de leite condensado – se paga (e como se paga), eticétera, eticétera, eticétera.

Nem sempre os não-amáveis para você serão não-amáveis para o outro. Isso acontece porque podemos detestar uma opinião dada a respeito de determinado assunto, mas isso não desqualifica quem o fez. Não é porque o vizinho gosta de batata doce e você detesta – que isso o torna horrendo. Não é porque seu colega de trabalho votou em tal candidato à presidência – que o torna medonho. Não é porque você não foi convidado para aquele churrasco na casa do primo – que isso o torna um babaca. Não foi bom pra você, mas pode ser para os outros. Não caiu bem pra você, mas cai para os outros. Não é conveniente pra você, mas é para os outros. Naquele momento a coisa não foi feita pra você, mas foi feita para os outros.

O mesmo que gosta de batata doce, que votou em tal candidato, que não te convidou para o churrasco, pode ser o mesmo que dias ou semanas ou meses ou anos atrás te estendeu a mão, sorriu pra você, te deu um copo com água, preparou um brigadeiro, te presenteou no aniversário, emprestou dinheiro, concordou com suas ideias, te elogiou, dormiu de conchinha, fez uma massagem ou cafuné, te deu carona, convidou para o cinema, te ouviu, pagou um sorvete de casquinha, orou por você (e hora até hoje, vai saber), te levou pra almoçar fora, serviu de cupido, testemunhou a seu favor, mentiu pra te safar de alguma furada, disse que está lindo (a), te acompanhou numa consulta médica, eticétera, eticétera, eticétera.

Continua no dever de casa, senhoras e senhores?

O tempo presente e o tempo futuro pertencem aqueles que amam. Pertencem aqueles que são capazes de amar os não-amáveis e a situações desfavoráveis pois acreditam na transformação através do amorrr. É somente por ele (amorrr) e com ele (amorrr) que mudaremos. É nele que ressurgiremos como um novo povo forte, unido pelo bem de verdade, pois amar quem é amável é fácil. Ao nos esforçarmos para privilegiar quem não merece com o nosso amorrr, ensinaremos o que é certo para as crianças de hoje. Aos adultos, desejo que desejem essa forma de viver. É compartilhando o que temos de melhor que multiplicamos dentro da gente. As sementes já estão florescendo, pois, nosso exército governa o mundo em silêncio. Ah! O amorrr é silencioso as vezes.

A lista cresceu.
Releia nome por nome.
Agradeça novamente quem te fez bem.
Ofereça uma flor pra quem te agrediu.
Peça perdão.
Perdoe.
Amorrr.
Eticétera, eticétera, eticétera.

Irmão Tiago, Salvador, 09 de abril de 2019.

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